Folhas 'grudentas' são usadas para capturar 'minhocas' como alimento.
Espécies do gênero 'Philcoxia' possuem características carnívoras.
Uma planta brasileira utiliza um mecanismo para capturar e devorar vermes (nemátodos) no cerrado de Minas Gerais, segundo um estudo divulgado na edição desta semana da publicação científica "Proceedings of the National Academy of Sciences". O pesquisador Rafael Silva Oliveira, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e colegas assinam o artigo que explica a descoberta, que também conta com cientistas dos Estados Unidos e da Austrália.
Ao iniciar o estudo, o grupo queria descobrir se algumas características das plantas do gênero Philcoxia e o fato delas habitarem um local muito iluminado e com solo pobre em nutrientes são suficientes para classificar essas espécies como carnívoras. Essas espécies são exclusivas do território brasileiro.
Exemplar da espécie 'P. minensis' encontrada no cerrado brasileiro. (Foto: PNAS / Divulgação)
Na pesquisa, a equipe optou por analisar a espécie P. minensis, típica de uma pequena faixa de areia na Serra do Cabral, no centro do país. Este tipo de vegetação é conhecida como campos rupestres, segundo Rafael Oliveira. "Nós classificamos a planta como carnívora no trabalho, já que mostramos que ela libera enzimas chamadas fosfatases usadas na digestão dos vermes", explica.
Mas a grande novidade que o estudo sobre a espécie mineira traz é o mecanismo que ela usa para capturar os vermes. As folhas subterrâneas liberam um líquido viscoso, que fazem os grãos do solo grudarem na superfície da planta e deixá-la repleta de areia. Esse processo nunca havia sido descrito em outra espécie vegetal.
Nitrogênio
Para saber se a planta tinha mesmo adquirido os nutrientes dos nemátodos, os pesquisadores usaram o nitrogênio-15, uma versão mais "pesada" do elemento químico mais abundante na Terra. Os vermes com o material foram oferecidos como "alimento" às plantas e, depois de 24 horas, cerca de 5% do nitrogênio das presas já se encontrava dentro das folhas. Um dia depois, esse percentual subiu para 15%.
Setas mostram grão de areia (abaixo) e verme
dentro de uma folha da espécie 'P. minensis'
em imagem obtida por microscopia eletrônica.
(Foto: PNAS / Divulgação)
Pedaços de vermes também foram encontrados dentro das folhas, tantos
nas plantas estudadas em herbários como naquelas analisadas no habitat
original. A atividade da planta sugere que os vermes foram digeridos
pela própria planta e não decompostos antes por micro-organismos
necrófagos -- que se alimentam de restos de plantas e animais.dentro de uma folha da espécie 'P. minensis'
em imagem obtida por microscopia eletrônica.
(Foto: PNAS / Divulgação)
"Essas armadilhas para nematódeos com folhas subterrâneas são as principais novidades científicas desse trabalho", afirma Rafael Oliveira.
A análise das folhas de P. minensis mostra que o alimento obtido a partir das presas são vitais para a sobrevivência da planta, que cresce em um solo pobre em nutrientes.
Carnívoras
Plantas precisam absorver nutrientes de animais mortos, saber atrair e capturar a presa para serem classificadas como carnívoras. Elas representam apenas 0,2% das espécies vegetais que possuem flores.
Suas folhas possuem concentrações maiores de elementos como nitrogênio, possásio e fósforo do que as de plantas comuns. "São conhecidos 20 gêneros de plantas carnívoras e cerca de 600 espécies", afirma o cientista.
Outras duas espécies do gênero Philcoxia também podem ser carnívoras, já que apresentam características parecidas com as encontradas em P. minensis: bahiensis e goiasensis, nomes que fazem alusão ao local onde os vegetais foram encontrados (Bahia e Goiás).
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